GNEWS João Santana













                          A prisão do marqueteiro João Santana e de sua mulher, Mônica Moura (ambos na foto), revelou um lado até agora pouco explorado do petrolão: suas ramificações internacionais. Apesar das andanças anteriores de procuradores por bancos na Suíça, Mônaco, Caribe e outros paraísos fiscais, desta vez os investigadores parecem ter descoberto não apenas dinheiro escondido, mas também crimes praticados no exterior.

Os relatórios da Polícia Federal que embasaram a nova fase da Operacão Lava Jato, batizada Acarajé, identificaram dinheiro da empreiteira Odebrecht que, segundo a PF, foi usado para pagar propinas na Argentina, no Peru e em El Salvador.

O governo peruano se apressou em negar que o presidente Ollanta Humalla tivesse recebido R$ 4,8 milhões da Odebrecht, como a PF inferiu de planilhas preparadas pelo executivo da empreiteira Fernando Migliaccio, preso este mês em Genebra, na Suíça, tentando fechar contas e esvaziar cofres bancários.

A PF também acusou Ricardo Raul Jaime, o secretário de Transportes no governo Cristina Kirchner, na Argentina, de receber propina da Odebrecht, como contrapartida por uma das mais controversas obras realizadas pela empreiteira naquele país, a modernização da linha férrea de transporte suburbano Ferrocaril Sarmiento, em Buenos Aires, que contou com um financiamento de US$ 1,5 bilhão do BNDES brasileiro.

Em relação a El Salvador, a suspeita é que a Odebrecht tenha destinado dinheiro do petrolão para propinas, usando para isso a campanha presidencial do candidato Maurício Funes, comandada pelo marqueteiro João Santana. Funes presidiu o país entre 2009 e 2014, período em que a Odebrecht disputou a obra de conclusão da hidrelétrica de El Chaparral, uma licitação envolvida em suspeitas, investigada pela Procuradoria da República e por uma comissão de inquérito no Legislativo. No final do ano passado, a construção da barragem foi atribuída a uma empresa russa.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é investigado pelo Ministério Público Federal do Distrito Federal, sob a acusação de ter realizado tráfico de influência internacional para a Odebrecht em países da África. De acordo com o inquérito, revelado na semana passada pela revista Época , Lula praticou o “crime de tráfico de influência” e foi remunerado em R$ 7 milhões por isso, por meio de um contrato fajuto de palestras. Os financiamentos do BNDES às obras da Odebrecht eram aprovados com uma velocidade 49% superior à da média, segundo afirmam os investigadores.

A Odebrecht sempre se apressou em negar qualquer tipo de irregularidade na relação com Lula ou nos financiamentos do BNDES. Argumenta que, num mercado globalizado, é natural que os países ofereçam vantagens às empresas nacionais para que elas consigam se manter competitivas numa disputa renhida. Existe uma diferença, contudo, entre a ação legítima de promoção comercial das empresas brasileiras e a corrupção de funcionários públicos de outros países ou do Brasil, em troca de financiamentos em condições extraordinárias. É isso que cabe aos investigadores esclarecer.

A defesa do marqueteiro João Santana reconhece que ele mantinha dinheiro não declarado no exterior, mas afirmou que esse dinheiro é resultado de campanhas realizadas fora do Brasil, não de lavagem de recursos desviados no petrolão. Faltou explicar, claro, por que esse dinheiro saiu de contas ligadas à Odebrecht e a um operador no Brasil das propinas pagas pelo estaleiro Kepper Fels e, ainda mais importante, por que os depósitos feitos por esse operador coincidem com o período  da última campanha eleitoral da presidente Dilma Rousseff.

Há, é verdade, ainda muito a desvendar a respeito das relações entre Lula, João Santana, as campanhas no exterior, as obras da Odebrecht e o dinheiro do petrolão e do BNDES. As investigações da Lava Jato e do MPF de Brasília compõem um quebra-cabeças em que ainda faltam diversas peças. Olhando para o quadro já descoberto, contudo, já é possível delinear os contornos da cena. É uma cena internacional, como os próprios negócios da Petrobras ou da Odebrecht. Uma cena em que os pratos servidos não se limitam ao acarajé – parecem incluir também ceviche, parrilada e uma iguaria feita com massa de milho e recheio de carne ou queijo conhecida como "pupusa", um dos pratos nacionais de El Salvador.