Votação é vista como demonstração de força e teste para outras reformas.
Economistas alertam que PEC define a 'meta do regime', mas não a dieta.
A aprovação da proposta de emenda à Constituição (PEC) que impõe um
teto para os gastos da União é vista como medida essencial para o
controle dos gastos públicos e, por consequência, para a recuperação da
economia brasileira. Economistas e analistas de mercado ouvidos pelo G1
alertam, entretanto, que, sem a aprovação de outras medidas, como a
reforma da Previdência, a mudança constitucional não garantirá o ajuste
fiscal nem a retomada do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).
"O governo colocou todas as suas fichas na PEC dos gastos. Ela é muito
simbólica porque é uma demonstração de força para o governo e ajuda a
aumentar as chances da reforma da Previdência também", diz Zeina Latif,
economista-chefe da XP Investimentos. "O regime fiscal que temos hoje
colapsou e é insustentável, tanto em razão de má gestão como também da
Previdência e do envelhecimento da população do país", completa.
Teste do governo
A proposta é vista por investidores e pelo mercado como a primeira medida econômica efetiva por parte do governo de Michel Temer. Sua aprovação é uma demonstração de força do governo e de que conseguirá executar sua agenda de reformas.
A proposta é vista por investidores e pelo mercado como a primeira medida econômica efetiva por parte do governo de Michel Temer. Sua aprovação é uma demonstração de força do governo e de que conseguirá executar sua agenda de reformas.
O avanço da PEC abrirá caminho para a melhora dos índices de confiança e para uma queda da básica taxa de juros (Selic) já na próxima reunião do Copom,
afirmaram analistas. A redução do juro básico impulsiona a expansão do
crédito e dos investimentos no país, favorecendo a retomada do
crescimento econômico.
Muitos economistas já consideravam a aprovação da PEC nas suas
projeções. "A aprovação era o cenário base de todos no mercado. Ninguém
considerava a não aprovação. Muita coisa está precificada e a aprovação
da PEC é a saída do discurso para a prática. É a mudança efetiva da
expectativa para a ação", afirma Adeodato Volpi Netto, chefe de mercado
de Capitais da Eleven Financial.
Sem as reformas que precisam ocorrer para modificar o crescimento ou a
evolução dos gastos públicos, esse teto irá virar nada, porque será
furado já em 2018"
Margarida Gutierrez, economista da Coppead/UFRJ
Volpi ressaltou que a aprovação da PEC coloca o país na direção
correta, mas que a recuperação da economia brasileira será lenta. "A
economia brasileira vai levar um tempo para se recuperar, porque ela é
um transatlântico. Não dá para dar um cavalo de pau, a mudança de
direção precisa ser gradativa. Estancar o gasto nesse momento é
fundamental."
A maioria dos analistas consultados pelo G1 concorda
que a rejeição da proposta pioraria o cenário econômico. "Os indicadores
de confiança já começaram a melhorar, mas é uma confiança que eu chamo
de emprestada, porque até agora nada foi feito. Por isso a PEC tinha de
ser aprovada, é uma primeira condição para discussão do resto", diz
Margarida Gutierrez, da Coppead/UFRJ.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, se recusou nesta
segunda-feira (10) a avaliar cenários sobre uma não aprovação da
proposta, em evento em Nova York. Ele lembrou que a rejeição da proposta
obrigaria o governo a contemplar possibilidades "muito piores".
Incertezas sobre a aplicação
Os economistas destacam que a PEC fixa um limite para o gasto público total, sem indicar como será feito o controle dos diferentes tipos de despesas que compõe o orçamento. Muitos dos gastos públicos são obrigatórios e com regras próprias de crescimento, como por exemplo Previdência Social, saúde e educação.
Os economistas destacam que a PEC fixa um limite para o gasto público total, sem indicar como será feito o controle dos diferentes tipos de despesas que compõe o orçamento. Muitos dos gastos públicos são obrigatórios e com regras próprias de crescimento, como por exemplo Previdência Social, saúde e educação.
Atualmente, o que mais consome os gastos públicos é a soma de
Previdência, benefícios e pessoal (cerca de 70% do Orçamento). Outros
15% vão para os gastos correntes, com regras também muito rígidas. Com
isso, sobra muito pouco para investimentos.
Esse regime fiscal põe a cinta e diz que não pode engordar, mas não diz o que fazer"
Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos
Zeina Latif compara a PEC a uma fita métrica ou cinta que mede a
cintura de alguém com obesidade e se limita a fazer o diagnóstico e
impor um limite. "Esse regime fiscal põe a cinta e diz que não pode
engordar, mas não diz o que fazer. O gordinho é que vai ter que correr
atrás de dieta, atividade física e se virar", compara a economista.
Para ela, o governo precisa aprovar instrumentos complementares de
corte e controle das despesas, como a reforma da Previdência. As
despesas com aposentadorias e pensões são apontadas como as principais
responsáveis pelo crescimento exponencial dos gastos públicos.
Margarida Gutierrez, da Coppead/UFRJ, também defende medidas
complementares para ajustar as contas públicas. "Sem as reformas que
precisam ocorrer para modificar o crescimento ou a evolução dos gastos
públicos, esse teto irá virar nada, porque será furado já em 2018",
alerta.
A aprovação da PEC é a saída do discurso para a prática. É a mudança efetiva da expectativa para a ação"
Adeodato Volpi Netto, da Eleven Financial
Para o economista e ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman,
um dos pontos positivos da PEC é justamente forçar a discussão entre os
governantes sobre a distribuição dos gastos. "Ela torna obrigatória a
discussão sobre onde cortar daqui para frente e acredito que não há
dúvida de que a Previdência deve ser a prioridade", diz.
Há quem veja também uma oportunidade para se perseguir uma melhor
eficiência no gasto público e a identificação de prioridades. "Vemos
tanto mau uso do dinheiro público, que acredito que se os gastos forem
corretamente alocados, será possível preservar o principal e retirar
apenas o supérfluo", diz Netto, da Eleven Financial. "O caminho das
privatizações é inevitável, mas não se trata apenas de arrecadação. A
redução do tamanho do estado implica em aliviar a obrigação de
investimento e de dispêndio no médio prazo", acrescenta.
Críticas à proposta
Os críticos da proposta e a oposição não concordam com a falta de definições sobre onde cortar os gastos. Para eles, há risco de estrangulamento nos investimentos em ações sociais do governo, principalmente nas áreas de saúde e educação, cujos repasses nos últimos anos vinham crescendo bem acima da inflação. Recentemente, entidades avaliaram que o setor de Saúde pode ter perdas bilionárias com PEC do teto. Pela regra defendida pelo governo, saúde e educação obedecerão o teto de gastos a partir de 2018.
Os críticos da proposta e a oposição não concordam com a falta de definições sobre onde cortar os gastos. Para eles, há risco de estrangulamento nos investimentos em ações sociais do governo, principalmente nas áreas de saúde e educação, cujos repasses nos últimos anos vinham crescendo bem acima da inflação. Recentemente, entidades avaliaram que o setor de Saúde pode ter perdas bilionárias com PEC do teto. Pela regra defendida pelo governo, saúde e educação obedecerão o teto de gastos a partir de 2018.
A PEC não é uma medida de estabilização fiscal, mas de imposição de um projeto de estado mínimo no Brasil"
Pedro Rossi, professor da Unicamp
"A PEC não é uma medida de estabilização fiscal, mas de imposição de um
projeto de estado mínimo no Brasil", critica o economista e professor
da Unicamp, Pedro Rossi. "Concordando ou não com a dosagem draconiana de
redução do estado em proporção ao PIB, devemos reconhecer que esse
movimento vai gerar enormes conflitos sociais", completa.
O Conselho Federal de Economia se posicionou contra a proposta e acusou
o governo de fazer um "falso diagnóstico" do déficit fiscal. Para a
entidade, o governo identifica "uma suposta e inexistente gastança do
setor público, em particular em relação às despesas com saúde, educação,
Previdência e assistência social, responsabilizando-as pelo aumento do
déficit público."
O conselho disse ainda que o governo omite as "efetivas razões" para o
déficit público, que são "os gastos com juros da dívida pública
(responsáveis por 80% do déficit nominal), as excessivas renúncias
fiscais, o baixo nível de combate à sonegação fiscal, a frustração da
receita e o elevado grau de corrupção."
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