Morador vizinho a presídios morreu no domingo, atingido por um tiro.
Audiência na OEA cobrou atitudes do governo a violações de direitos.
Na mesma semana em que um representante do governo estadual viajou à Costa Rica para dar explicações à Organização dos Estados Americanos (OEA)
sobre violações de direitos humanos no Complexo Prisional do Curado, a
crise no maior presídio de Pernambuco ganha mais um capítulo. Nos
últimos meses, a rotina foi de presos mortos e feridos, armas e
celulares flagrados nas mãos de detentos, planos de fuga, brigas,
rebeliões e protestos. Desta vez, as consequências saltaram os muros do
antigo Presídio Aníbal Bruno. Um morador da vizinhança foi morto por uma bala perdida em meio a um tumulto numa das unidades do conjunto prisional. Para analistas e vizinhos, a tragédia era iminente.
Veja no video acima as queixas dos moradores vizinhos e reveja as últimas ocorrências.
Especialista em população carcerária, a professora de direito penal Marília Montenegro, da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), afirma que os números explicam a crise. O Complexo Prisional do Curado tem capacidade para 1.819 presos, mas abriga 6.965, quase quatro vezes mais. Além disso, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mais de metade da população carcerária é formada por presos provisórios.
Veja no video acima as queixas dos moradores vizinhos e reveja as últimas ocorrências.
Especialista em população carcerária, a professora de direito penal Marília Montenegro, da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), afirma que os números explicam a crise. O Complexo Prisional do Curado tem capacidade para 1.819 presos, mas abriga 6.965, quase quatro vezes mais. Além disso, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mais de metade da população carcerária é formada por presos provisórios.
“Há uma ligação direta aí. Trata-se de um estabelecimento que tem muito
mais pessoas do que o local comporta, e o Estado não consegue
gerenciar. Existe outro fator que é o Complexo Prisional do Curado
trabalhar prioritariamente com presos provisórios, ou seja, pessoas que
não têm certeza de que serão condenadas e que, muitas vezes, ficam
presas aguardando julgamento por mais tempo do que as penas de seus
crimes”, pondera.
A curto prazo, Marília Montenegro sugere à Secretaria Executiva de
Ressocialização (Seres) adotar as audiências para presos em custódia,
medida que faria com que apenas casos mais graves rendessem prisão.
"Estamos lidando com isso, com as audiências de custódia. No Recife,
houve uma liberação de quase 38% dos que foram apresentados. Outra
medida urgente é a questão da agilização dos processos. Para isso, em
Pernambuco, contratamos advogados para atuar nas unidades", afirmou, por
telefone, o secretário de Justiça e Direitos Humanos, Pedro Eurico,
logo após sair da audiência na OEA.
No Alto da Bela Vista, onde o montador de bicicletas Ricardo Alves da
Silva, 33 anos, morava, é o medo quem dita a análise. “Depois que
fizeram esse Complexo Prisional a gente não tem paz. Quando tem tumulto,
a gente precisa se esconder. Nosso bairro é um camarote dos absurdos
que tem lá”, diz o comerciante Marcílio Souza, 48, vizinho de Ricardo.
Autônomo Ricardo Alves morreu ao ser atingido
por tiro no domingo, em casa
(Foto: Reprodução/ TV Globo)
por tiro no domingo, em casa
(Foto: Reprodução/ TV Globo)
Um dos sete irmãos da vítima, o comerciante Maviael Alves, 43, culpa o
Estado pela morte do irmão e pelo caos instalado no sistema prisional.
“Se o governo matou meu irmão, o governo vai ter que criar os dois
filhos dele. Vamos acionar o Estado”, dispara.
Pedro Eurico viajou na segunda-feira a San José, capital da Costa Rica,
para responder a um processo iniciado em 2011 pela OEA e que, num
dossiê com mais de 700 páginas, lista abusos e problemas encontrados no
Complexo Prisional do Curado, entre os quais assassinatos e até casos de
tortura.
“É péssimo que uma entidade exterior necessite interferir nos problemas
internos. O Brasil é recorrente nessas situações. Já fomos condenados
no passado por causa do presídio de Pedrinhas, no Maranhão, e Urso
Branco, em Rondônia. Isso dá a entender que o país não tem capacidade de
resolver seus problemas”, avalia o professor de relações internacionais
Thales Castro.
Para o especialista, o governo estadual só tem duas saídas para tentar
amenizar o julgamento. A primeira seria admitir que continua falhando em
relação ao sistema prisional. A segunda, firmar um pacto para melhorar,
efetivamente, as condições dos presídios. “É preciso mudar o pensamento
e a conduta presidiária para garantir a vida dos presos, de quem
trabalha no presídio e da vizinhança”, salienta.
Castro concorda com a mudança do conjunto de presídios para outro
lugar. “O Complexo Prisional do Curado foi planejado muito tempo atrás
para receber 2 mil presos. Hoje são 7 mil. Estudos deveriam ser feitos
para relocá-lo, pois ali é um lugar com um grande quantitativo
populacional. É um perigo para quem mora perto”, analisa. A vizinhança
concorda. “Quem não tem medo? Estamos à mercê”, desabafa o aposentado
João Araújo, 72.
O secretário Eurico afirma que a mudança de local do complexo não seria
a solução. "De jeito nenhum. O problema é que foram construídas dezenas
de casas no passado, até em áreas de segurança, são invasões. Se alguém
que vai ter que sair, são as pessoas que estão no entorno ilegalmente. A
questão para nós é a garantia da integridade dos que estão no entorno e
também dos presos e agentes penitenciários. Mas de forma nenhuma
retirar o presídio. Nós temos várias imagens mostrando que as pessoas se
aproximam das muralhas e lançam drogas e armas para dentro do presidio.
Estamos coibindo isso", finaliza.
Na
segunda-feira (28), moradores fizeram protesto do lado de fora do
Complexo Prisional do Curado, contra a morte do vizinho por bala perdida
(Foto: Reprodução/Whatsapp)
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