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quinta-feira, 13 de março de 2014

Moderado, Papa deve trabalhar mais para mudar Igreja, dizem especialistas

Papa Francisco completa um ano de pontificado nesta quinta-feira (13).
Apesar de ações 'progressistas', pontífice ainda terá trabalho pela frente.

Eduardo Carvalho Do G1, em São Paulo
selo infográfico do papa (Foto: Editoria de Arte/G1)
Um Papa moderado, mas progressista em comparação com os anteriores. Tenta mudar a imagem de uma Igreja Católica tradicionalista, mas deixa em banho-maria temas espinhosos, como a punição para sacerdotes envolvidos com pedofilia ou a qualificação moral do casamento gay – apesar de ligeiros avanços nesses assuntos.

Essa é a visão que especialistas ouvidos pelo G1 têm sobre Jorge Mario Bergoglio, o argentino que completa nesta quinta (13) um ano sob a alcunha de Francisco e herdou o desafio de liderar mais de 1 bilhão de católicos após a renúncia de Bento XVI, atual Papa Emérito.
Logo nos primeiros dias de seu pontificado, Francisco imprimiu sua marca pessoal ao papado. Como jesuíta e adepto ao voto de pobreza, recusou aposentos luxuosos no Vaticano, assim como roupas extravagantes, assumiu seu lado latino ao sinalizar que queria ficar mais perto dos fiéis e dos pobres, e que o restante do clero tinha que fazer o mesmo.
Nos últimos 12 meses, o pontífice tem apresentado seu cartão de visitas ao mundo no intuito de divulgar mais a religião católica e arrebanhar público. Mas, segundo especialistas, ainda terá de arregaçar mais as mangas para sacudir a instituição milenar.

Infográfico feito pelo G1 mostra os principais assuntos abordados pelo Papa ao longo do primeiro ano da gestão de Francisco (veja clicando na imagem acima).
A seguir, saiba os temas que o Papa tratou nos últimos 12 meses, segundo especialistas.

1 - Pedofilia na Igreja
2 - União homossexual
3 - Reforma da Cúria e do Banco do Vaticano
4 - Legalização das drogas
5 - Defesa da vida
6 - Intervenção da Santa Sé no cenário internacional
7 - Papa progressista ou conservador?
Papa Francisco em diferentes momentos ao longo do primeiro ano de seu pontificado: com cocar indígena, em visita ao Rio de Janeiro; com criança vestida de Papa, no Vaticano; com a presidente Dilma Rousseff; e atendendo confissão durante sua primeira visita oficial como Papa, feita ao Brasil em 2013 (Foto: Danilo Verpa/Folhapress; L'Osservatore Romano/AP; Roberto Stuckert Filho/PR; L'Osservatore Romano/Reuters)Papa Francisco em diferentes momentos ao longo do
primeiro ano de seu pontificado: com cocar indígena,
em visita ao Rio de Janeiro; com criança vestida de
Papa, no Vaticano; com a presidente Dilma Rousseff;
atendendo confissão no Brasil em 2013
(Fotos: DaniloVerpa/Folhapress; L'Osservatore
Romano/AP; Roberto Stuckert Filho/PR;
L'Osservatore Romano/Reuters)
1 - Pedofilia na Igreja
Meses após tomar posse, em julho de 2013, Francisco aprovou decreto que endureceu as sanções penais a quem cometer abusos contra menores na Santa Sé e na Cúria, além de reformar o código penal do Estado da Cidade do Vaticano. Em dezembro passado, o Vaticano criou comissão para proteger vítimas e combater os casos de pedofilia.
Segundo Eulálio Figueira, doutor em religião pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Francisco tem dado declarações “seguindo na direção de condenar tais atos para que aqueles que os cometam sejam julgados ao abrigo das leis civis dos países”.
No entanto relatório do Comitê da Organização das Nações Unidas para os Direitos da Infância sugeriu que a Igreja Católica deveria “afastar imediatamente” todos os clérigos suspeitos e denunciá-los às autoridades civis, para que possam ser responsabilizados.
Apesar do Vaticano alegar que enfrenta os casos de pedofilia com transparência, para o historiador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Leandro Karnal, “a política de acobertamento criada por João Paulo II e Bento XVI não sofreu uma guinada total”. Segundo ele, as declarações sobre o combate à pedofilia são fracas e há dúvidas de que a Igreja Católica vá se submeter a Justiça comum. “A tradição histórica é de não fazê-lo”, disse.

2 - União homossexual
Em julho, ao retornar do Brasil após participar da Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro, Francisco declarou em entrevista que os gays não podem ser marginalizados e devem ser integrados à sociedade. “Se uma pessoa é gay e procura Jesus, e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la”, disse o Papa.
À época, o Vaticano frisou que as palavras do Papa não mudavam a posição da Igreja Católica, de que as tendências homossexuais não são pecaminosas, mas sim os atos.
Segundo Brenda Carranza, cientista social e professora da PUC-Campinas, a postura do pontífice de "não julgamento e sim de acolhida" traçou o tom com que ele iria "lidar com temas escabrosos no interior da Igreja”. Mas, para o padre Jesus Hortal, ex-reitor da PUC do Rio de Janeiro, Francisco “não acenou, em nenhum momento, com mudanças na qualificação moral da conduta homossexual”, disse.

3 - Reforma da Cúria e do Banco do Vaticano
O novo Papa determinou a criação de um conselho de cardeais apelidado G8 para estudar um projeto de revisão da constituição apostólica da Cúria Romana e instalou comissão para fiscalizar o Banco do Vaticano – e evitar novos escândalos envolvendo lavagem de dinheiro e empréstimos duvidosos, que causaram constrangimentos à Igreja Católica.
Além disso, lançou consulta global sobre a evolução da família moderna, com um questionário que abordará assuntos sensíveis como divórcio, casamento homossexual e adoção de crianças por esses casais.
Entre seus atos mais recentes está a nomeação de arcebispos de várias partes do mundo (e não apenas da Itália ou ligados à Cúria) como cardeais, um sinal de diversificação da Igreja.
Segundo Leandro Karnal, Francisco tem gosto por assuntos administrativos e interfere neles, o que, de acordo com o historiador, foi deixado de lado pelos Papas anteriores, que permitiam que o Vaticano “fosse entregue ao segundo escalão”. “A Cúria Romana é a mesma há muito tempo. Corre o risco desta ser a maior mudança de Francisco”, explicou.

4 - Legalização das drogas
Em discurso proferido no Rio, em um hospital para dependentes químicos, Francisco criticou países latino-americanos que discutiam a descriminalização das drogas. Segundo ele, “não é deixando livre o uso das drogas que se conseguirá reduzir a difusão e a influência da dependência química”. A declaração causou polêmica.
De acordo com Brenda Carranza, o pontífice não quer "atribuir uma defesa ou recusa da legalização das drogas e sim denunciar a violência pessoal e estrutural que elas trazem".

5 - Defesa da vida
Francisco se declara contrário à eutanásia, ao aborto e ao uso de contraceptivos (como camisinhas, incluindo como forma de prevenção à Aids, e pílula anticoncepcional), conforme prega a doutrina da Igreja Católica. “Ele defende a vida desde sua concepção, até a morte natural”, diz o padre Jesus Hortal. O que mudou, segundo Karnal, é que o pontífice “recomendou mais atenção aos temas, mais ênfase”.
 6 - Intervenção da Santa Sé no cenário internacional
Ao emitir opinião sobre o conflito na Ucrânia, a guerra na Síria e lembrar os imigrantes ilegais que morreram em naufrágios próximos a Lampedusa, na Itália, em travessias rumo à Europa, Francisco quer tornar o Vaticano uma referência maior para o mundo. "Ele quer mostrar que a Igreja Católica não deve ser mais uma potência apolítica, mas que deve explorar o peso eleitoral dos católicos nos países", disse Leandro Karnal, da Unicamp.
"Não é que os predecessores do Papa atual deixassem de lado esses assuntos, mas sempre o fizeram na linguagem diplomática. Francisco tem falado muito claramente", disse Jesus Hortal.

7 - Papa progressista ou conservador?
Moderado, seria a resposta correta de acordo com especialistas ouvidos pelo G1. Para eles, Francisco é "um pouco mais progressista que seus antecessores, Bento XVI e João Paulo II", mas ainda tem tomado ações comedidas.
“É um líder sensato e atento aos sinais do tempo, mas classificá-lo como progressista ou conservador é perigoso”, disse Eulálio Figueira. “O perfil de Francisco é moderado ideologicamente”, afirma Brenda Carranza.
Leandro Karnal e o padre Jesus Hortal concordam que os traços progressistas, quando existem, estão apenas no pontífice "e não em toda a Igreja", indicando que ainda é preciso muito trabalho para modificações concretas perceptíveis aos católicos.
“Numa Roma com mais de 2 mil anos de história, 12 meses é um tempo curto para fazer algo com maior envergadura”, disse Hortal.

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