Para especialistas, crítica de Dilma a espionagem foi resposta à opinião pública brasileira
O tom rígido adotado pela presidente Dilma Rousseff nesta terça-feira
(24) em seu discurso de abertura da 68ª Assembleia Geral da ONU foi uma
atitude digna de "chefe de Estado" e uma forma de mostrar ao povo
brasileiro que o país é comandado por uma líder capaz de dar uma
"resposta altiva" ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. É o
que dizem especialistas ouvidos pelo UOL.
Em seu discurso em Nova York, Dilma afirmou que os Estados Unidos violam os direitos humanos
e as liberdades civis ao espionar governos e cidadãos pelo mundo - o
governo dos EUA é acusado de espionar inclusive dados pessoais da
presidente. Em resposta, Obama disse na assembleia que os EUA estariam revisando a maneira como coletam informações.
Entenda o caso de espionagem
Em 1º de setembro deste ano, o "Fantástico", da Rede Globo, exibiu uma reportagem no qual mostrou que e-mails pessoais da presidente Dilma foram interceptados pela NSA. Em 8 de setembro, uma segunda reportagem apontou que a Petrobras, maior empresa brasileira, também foi espionada pelos norte-americanos.
As reportagens foram produzidas em parceria com o jornalista
norte-americano Glenn Greenwald e baseada em documentos vazados pelo
ex-agente da NSA Edward Snowden
Para Antonio Carlos Lessa, professor de relações internacionais da UnB
(Universidade de Brasília), o objetivo de Dilma foi o de se afirmar
diante da opinião pública.
"O discurso está muito mais relacionado à política interna do que
externa. Dilma quis se afirmar diante da opinião pública. Deu uma
resposta altiva ao presidente Obama. Seu discurso serviu para reiterar a
postura de altivez que ela quer passar, de que está se fazendo
respeitar", afirmou Lessa, que criticou, contudo, que a presidente não
atue da mesma forma com a Bolívia, por exemplo.
O coordenador de relações internacionais da ESPM-SP, Rodrigo Cintra,
disse que Dilma agiu da forma esperada. "Como chefe de Estado, ela tinha
que fazer isso. Houve um atentado à soberania do país. É o que se
espera de um chefe de Estado", afirmou.
De acordo com Cintra, o discurso da presidente é uma resposta tanto aos
brasileiros quanto à comunidade internacional. "O Brasil abre a
Assembleia Geral da ONU e o que se espera é que dê o tom da reunião. Há,
então, a expectativa de que o Brasil levante questões que precisam ser
debatidas. E o mundo inteiro está reclamando da espionagem", completou.
"A abertura dos debates gerais é um momento importante da diplomacia
brasileira, é quando o Brasil pode mostrar ao mundo sua visão acerca das
relações internacionais", completou Lessa. "E não é sempre que o
presidente vai. Então, quando vai, o discurso ganha uma carga política
muito forte, principalmente do ponto de vista interno."
Embora tenha afirmado que a presidente tentou "capitalizar
internamente", Antonio Lessa disse não acreditar que o foco do discurso
seja a disputa presidencial de 2014. "Não tem fim eleitoreiro, mas tem
fim político", afirmou, emendando que o tema da espionagem deverá perder
fôlego até as eleições, o mesmo defendido por Cintra. "Acho que estamos
muito longe da demanda de 2014", disse o professor da ESPM.
24.set.2013
- Em resposta às críticas de Dilma Rousseff sobre a espionagem
norte-americana ao governo brasileiro, o presidente dos EUA, Barack
Obama, disse que o país já começou a revisar a maneira de coletar
informações Leia mais John Moore/Getty Images/AFP/Arte UOL
Quanto ao futuro das relações entre Brasil e Estados Unidos, Lessa
disse acreditar que o pior já passou, referindo-se ao fato de Dilma ter adiado a visita oficial que faria aos EUA em outubro.
"O complicado foi ter adiado a visita de Estado. Nas relações
bilaterais essa é uma linguagem muito dura, muito violenta. Então,
depois daquilo, o discurso de hoje não fez muito estrago", afirmou.
Para o jornalista americano Glenn Greenwald, que revelou ao mundo o programa de espionagem, os EUA "devem pagar" por destruír a privacidade.
"O discurso mostra que vivemos em um mundo em que outros países agora
têm um poder de influência mais significativo. E, por isso, os EUA não
podem mais sair por aí fazendo o que querem sem sofrer consequências",
disse.
Já para a oposição, o discurso de Dilma é mera publicidade. Em um
comunicado divulgado á imprensa, o presidente do PSDB, senador Aécio
Neves (MG), disse que o governo brasileiro precisa assumir "sua
responsabilidade em relação à defesa cibernética do país" em vez de
tratar a questão "sob a ótica do marketing".
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