Reconstituição do crime aconteceu na Usina de Açúcar Cambaíba, em Campos. Guerra disse que os corpos chegavam amarrados em sacos.
MPF explicou como os corpos eram colocados nos fornos (Foto: Letícia Bucker/G1)
Durou, aproximadamente, uma hora a reconstituição do caso sobre a
incineração de militantes políticos contrários à Ditadura Militar, que
foram torturados e assassinados na 'Casa da Morte' em Petrópolis, na
Região Serrana do Estado, e queimados na Usina de Açúcar Cambaíba, em
Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense. O ex-delegado da Polícia
Civil do Espírito Santo e ex-agente do Serviço Nacional de Informações
(SNI), Cláudio Guerra, participou da ação e, detalhadamente, explicou
como os corpos eram levados para as fornalhas da usina.
Claudio Guerra disse que espera o perdão de Deus
pelas atitudes cometidas (Foto: Letícia Bucker/G1)
pelas atitudes cometidas (Foto: Letícia Bucker/G1)
O Ministério Público Federal (MPF), apoiado pela Polícia Rodoviária
Federal (PRF), conduziu Cláudio Guerra, nesta terça-feira (19), até os
fornos onde os corpos teriam sido incinerados para a reconstituição do
crime. Manequins foram usados como modelos para que o ex-delegado
explicasse como tudo acontecia. Guerra disse que os corpos chegavam em
caminhonetes e eram queimados durante a noite, quando havia pouco
movimento de funcionários. Pelo menos 12 pessoas teriam sido incineradas
em Campos. A reconstituição fez o MPF concluir que era possível queimar
os corpos nas fornalhas.
Os corpos teriam sido colocados nestes fornos da
Usina Cambaíba em Campos
(Foto: Letícia Bucker/G1)
Usina Cambaíba em Campos
(Foto: Letícia Bucker/G1)
“Os corpos chegavam em sacos plásticos pretos amarrados com cordas.
Ninguém desconfiava que estávamos queimando pessoas. O movimento era
disfarçado porque sempre haviam funcionários alimentando os fornos com
lenha. O odor forte do vinhoto mascarava o cheiro”, explicou Cláudio
Guerra.
De acordo com o procurador da república, Eduardo Oliveira, a ideia de
incinerar corpos da Ditadura surgiu através de Cláudio Guerra e do
coronel Freddie Perdigão Pereira, morto em 1998. Perdigão pertencia ao
Exército Brasileiro e seria um dos chefes da 'Casa da Morte', onde, pelo
menos, 22 presos políticos podem ter sido executados.
Ainda de acordo com o procurador, a intenção do MPF é estabelecer, ou
não, uma ligação entre o Exército Brasileiro e a Usina, àquela época. “A
gente pretende conseguir, até o final deste ano, dar uma resposta à
sociedade se houve, ou não, incinerações em Campos. A família do
proprietário da usina e as família das pessoas que desapareceram, estão
há anos anos nesta incógnita. A nossa intenção é conseguir dar uma
resposta e que a sociedade conheça os fatos”, comentou.
Cláudio Guerra disse que o Exército não é o culpado, mas os integrantes
daquela época sim. “O que aconteceu é que erramos e agora temos que
confessar e pedir perdão à nação. Hoje, a ideia é outra, as forças
armadas são outras, há uma nova mentalidade, mas no passado houve o
erro. Temos que confessar esses erros e tentar mudar. A minha confissão
de participação é para tentar ajudar a esclarecer o que realmente
aconteceu. Esta é uma história que precisa ser passada a limpo. Por isso
a minha confissão. Os outros envolvidos não se expõem por temor a
cadeia. Outras pessoas também podem ajudar a contar essa história”,
disse.
Procurador da República, Eduardo Oliveira,
perguntava ao ex-delegado, como eles levavam os
corpos até à Usina (Foto: Letícia Bucker/G1)
perguntava ao ex-delegado, como eles levavam os
corpos até à Usina (Foto: Letícia Bucker/G1)
O procurador Eduardo Oliveira explicou que Cláudio Guerra confessou ser
um braço do regime militar e também assumiu a autoria do assassinato do
tenente Odilon, morto em Cambaíba. Depois de uma discussão na Usina,
Cláudio Guerra sacou a arma e assassinou o tenente.
Perguntado como era voltar ao local onde ajudou a incinerar os corpos, o
ex-delegado, que atualmente é pastor evangélico, disse que mantém a
sobriedade enquanto ajuda a esclarecer os fatos, mas que espera o perdão
de Deus.
“Deus perdoa os nossos pecados se nós os confessarmos sinceramente. Do
homem, eu não sei o que vai acontecer. Só Deus que vai poder dizer.
Processado eu não sei se vou ser, pois pela lei do tempo o crime está
prescrito. Mas, passa um filme na minha cabeça”, comentou, Guerra.
“Pode ser que o MPF denuncie o ex-delegado. Nossa intenção é mover uma
ação civil pública, pra responsabilizar o Governo por essas mortes, ou
mesmo, denunciar criminalmente Cláudio Guerra e outros envolvidos. O
fato dele estar colaborando não o isenta de uma ação criminal por parte
do Ministério Público Federal. O MPF o considera assassino e quer vê-lo
na cadeia, independente das razões dele”, disse Eduardo Oliveira.Confira aqui a galeria de fotos.
Manequins foram usados durante a reconstituição (Foto: Letícia Bucker/G1)
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